Por: Jair Fonseca
A afirmação de que Luís de Camões teria sido maçom é um tema que permeia os debates sobre a vida e obra do poeta português há muitos anos. No entanto, não há qualquer evidência histórica concreta que sustente essa afirmação.
Mas afinal quem foi o nosso poeta Português?
Estima-se que o nascimento de Camões tenha ocorrido algures na primeira metade do século XVI, no ano de 1524, com a sua morte a proporcionar-se a 10 de junho de 1579 ou 1580, data em que se celebra o feriado nacional, o Dia de Portugal, de Camões e das comunidades portuguesas. São mais as incertezas do que as certezas sobre os contornos da sua vida, mas consta-se que teve Lisboa como a cidade principal da sua vida, assim como a presença de Coimbra, na qual aprendeu o latim, e aquilo que se tinha vivido e escrito nos séculos anteriores ao da sua vida. Foi membro da corte, na condição de poeta lírico, embora tenha assumido uma vida incauta, que o conduziu a um autoexílio em África. Foi lá, como militar do exército português, que perdeu o seu olho direito, acabando por voltar a Portugal. No entanto, voltaria a viajar, desta feita para o Oriente, onde redigiu “Os Lusíadas”, obra que quase perdia em pleno alto mar.
Luís Vaz de Camões é a referência maior da literatura portuguesa. Bebeu dos clássicos gregos e romanos para a composição maior dos sonetos e da sua maior obra, “Os Lusíadas”. Por muito que a sua vida tenha sido sofrida e atribulada, o poeta notabiliza-se por uma educação requintada, que lhe permitiu estabelecer o contacto íntimo e inspirativo com as referências da poesia de então. A sua imortalidade alcança quase o mesmo período que a distância percorrida entre Camões e vários dos seus precursores, distância essa que vangloria a sua pertença lusitana e os feitos do seu povo.
A obra “Os Lusíadas”, dedicada a D. Sebastião, que lhe asseguraria uma pensão pela sua anterior presença na coroa, embora morresse de forma depauperada, ainda antes do monarca se perder em Alcácer-Quibir. A sua poesia perduraria em “Rimas”, assim como algumas peças de teatro, que fomentariam um legado prestigioso, não só dentro de Portugal, mas também de fora, inspirando uma série de correntes literárias e de autores românticos.
O seu pecúlio foi redigido já no final dos tempos renascentistas que assolavam a Europa, numa transição para a Idade Moderna. No entanto, Camões foi cativado por esse revivalismo do que se fez na Antiguidade Clássica, recuperando o humanismo e o naturalismo, sem esquecer a emergência da Ciência como fonte de conhecimento, mesmo perante as doutrinas religiosas vigentes. Os Descobrimentos acabaram por solidificar uma visão do mundo cada vez mais ampla, numa abordagem cada vez mais expansionista, tanto no sentido de desvendar, mas também na intenção de transmitir os saberes dos grandes empreendedores dessa fase. O Renascimento funde o paganismo com o cristianismo, sem esquecer as próprias expressões esotéricas, mas também a fundação das novas formas de interação sócio-econômica, essencialmente no comércio.
Essa recuperação do que havia sido feito e dito na Antiguidade perdia-se com a chegada do protestantismo, que radicalizou a atuação da Igreja Católica. Os artistas perdiam, assim, muita da sua liberdade criativa e imaginativa, embora procurassem formas alternativas que exprimir essa inquietação dos tempos que chegavam. Por Portugal, os efeitos da Igreja Católica faziam-se sentir, com a subserviência do poder real à materialização da voz divina. Porém, a vontade de louvar os feitos concretizados por um país de descobertas e de superações era acrescido, mesmo com o fantasma de uma possível perda de soberania a já pairar no ar, no rescaldo de uma crise de sucessão e de desaires nas suas possessões
Tanto na poesia como no drama, Camões construiu o seu legado como referência da língua portuguesa, firmando-a como um dos registos idiomáticos mais singulares e perenes da Europa. A tradição latinizada da escrita não alcançou, por isso, as intenções camonianas de fazer prevalecer o português. A erudição da sua redação permaneceu como um padrão evolutivo do idioma, com códigos escritos próprios da oralidade, e que permitiu a introdução de vários termos latins no uso corrente da língua nacional.
Foi somente após a restauração da independência, no século XVII, que se efetuou um estudo sobre a obra de Camões, estudo que conheceu repercussão em França e em Inglaterra, merecendo as atenções de Montesquieu e de Voltaire, que consideraram as novidades introduzidas nas epopeias. Com a emergência da independência brasileira, também foram muitos aqueles que se inspiraram no luso para algumas das suas obras, como o poeta Gregório de Matos, Cláudio Manuel Costa e o imigrante Tomás António Gonzaga, herdeiros do movimento arcadista. Também Carlos Drummond de Andrade, já contemporâneo, se deixou influenciar pela poesia camoniana, assim como Haroldo de Campos. A poesia anglófona, encabeçada por John Milton, Lord Byron, William Wordsworth, Emily Dickinson, Elizabeth Browning e Edgar Allan Poe, beberam da tradição camoniana, ingerindo influências que remontavam ao subtil e ao erudito, aquando do encanto pelo latim.
Luís Vaz de Camões cruzou o seu destino com o português, o da sua pátria, em decadência e em perda, até se encontrarem na eternidade de uma referência que permanece elementar quando se fala de Portugal, por mais controvérsias que surjam em torno da sua vida e obra. O dia 10 de junho, data da sua morte, é uma mera indicação do calendário de alguém que se tornou extensível a todos os meses, anos e séculos pela importância assumida na literatura de língua portuguesa. A sua valorização da Antiguidade Clássica fecha com chave de ouro o Renascimento artístico, que orienta o contributo mitológico e as formas de escrever na Antiguidade Clássica para algo que é, ainda assim, muito presente. Camões é omnipresente na identidade portuguesa (até num “vai chatear o Camões) e no falar português, assumindo o protagonismo heroico e poético de um caminho falado profético.
A tradução do trabalho de Camões, assim como das exegeses feitas da sua obra, conduziu essa internacionalização, mas não ofuscou aquilo que foi o seu estudo dentro de portas, mobilizando o arcadismo, em que se denota Bocage, mas também o romantismo, nos vultos de Almeida Garrett e de Antero de Quental. A sua biografia foi sendo adulterada com o tempo, a bem de uma glorificação da vida de Camões, embora sem corresponder à realidade.
Luís Vaz de Camões cruzou o seu destino com o português, o da sua pátria, em decadência e em perda, até se encontrarem na eternidade de uma referência que permanece elementar quando se fala de Portugal, por mais controvérsias que surjam em torno da sua vida e obra.
Os últimos anos de Camões foram amargurados pela doença e pela miséria. Reza a tradição que se não morreu de fome foi devido à solicitude de um escravo Jau, trazido da Índia, que ia de noite, sem o poeta saber, ia mendigar de porta em porta o pão do dia seguinte.
Portanto se pouco sabemos de Camões, biograficamente falando, tudo sabemos da sua pessoa poética, já que não muitos poetas em qualquer tempo transformaram a sua própria experiência e pensamento numa tal reveladora obra de arte como foi a sua poesia.
Mas afinal, ele era mesmo maçom? A principal razão para duvidar dessa associação é a cronologia. A Maçonaria, tal como a conhecemos hoje (especulativa), surgiu séculos após a morte de Camões.
E também não existe qualquer documento, carta ou registro histórico que vincule Camões à Maçonaria. Algumas pessoas tentam encontrar em seus poemas e obras teatrais referências que, em suas interpretações, sugeririam uma ligação maçônica. No entanto, essas interpretações são subjetivas e carecem de fundamentação histórica.
A associação entre Camões e a Maçonaria é um mito persistente, mas infundado. A falta de evidências históricas e a cronologia dos acontecimentos tornam essa hipótese improvável. É fundamental basear nossas interpretações em fatos históricos e evitar projeções anacrônicas.
A questão das inspirações maçônicas na obra de Luís de Camões é um tema fascinante, mas também bastante complexo e controverso.
É possível que Camões tenha participado de alguma sociedade secreta ou confraria da época, que poderiam ter compartilhado alguns dos princípios da Maçonaria, porem carece de muito estudo e pesquisa.
Autor: Ir∴ Jair Fonseca Santos 33º – MI